segunda-feira, 9 de setembro de 2019

A SAGA DA GARÇA-REAL






Por – Wilson Belchior


Há quem chame Sobral de, Cidade das Cenas Fortes. A acepção de forte aquí, refere-se aos fatos que nela ocorreram e a marcaram para sempre, como o que passarei a relatar.

No princípio dos anos 30 o sr. Falb Rangel construiu sua residência na Rua da Aurora, numa das esquinas da Praça da Meruoca. Querendo embelezar o jardim, chamou o artista sobralense, Pedro Frutuoso do Vale, para construir uma Garça-Real, que o artista criou com requinte.


Essa Garça-Real passou anos decorando o jardim de sua residência, sem entretanto chamar a atenção que Falb imaginara. Porém, quando ele se mudou para a nova casa, que construiu no Boulevard Dr. Guarany, não reservou local para o ornamento, e a colocou no ostracismo, guardando-a no depósito do porão.


Por essa época, o sr. Agripino Souza, construiu sua bela mansão, na Praça São Francisco, e sabedor do destino dado pelo Falb, à Garça-Real, dele a comprou, instalando-a no jardim, onde por anos permaneceu, enchendo Agripino de orgulho, por a Garça-Real melhorar a aparência de sua residência.


Contam em Sobral que, certa vez Agripino, estando no mercado fazendo compras, os cestos nos quais as compra colocara, ficaram pesados, o obrigando a contratar um menino carregador, para as levar até sua casa. Pagou para tal ao menino, que se encontrava com um amigo, e explicou-lhe para onde deveria levar as compras.


Explicou, várias vezes, sem o menino entender, até que o outro que com ele estava disse-lhe, não se preocupe Toínho, eu sei aonde é, é na Praça São Francisco, na “Casa da Ema”, e pegaram os cestos e com o dinheiro no bolso, saíram levando as compras.


A explicação do menino, deixou Agripino intrigado, ao ver a casa de sua família identificada, como a “Casa da Ema”. Decorrido certo tempo, o fato, como era de se esperar, caíu no Beco do Cotovelo, donde se irradiou pela cidade, ser a casa do Agripino Souza a “Casa da Ema”, passando assím a ser conhecida e chamada, por toda a população, para desassossego do Agripino.


Agripino de forma alguma aceitou a denominação, e pensou em quebrar a Garça-Real, que tanto prazer lhe dera, ou em tirará-la e guardá-la num porão, como fizera o Falb.


Não chegou a tanto, pois, visitando Chico Monte, no início dos anos 40, dele ouviu: Agripino, você que construíu uma bela mansão, que é conhecido na cidade como homem inteligente, poderia ajudar ao Vicente Antenor, como ocupar a área interna frente ao São João.


Agripino gostou da ideia, venda nela a oportunidade de se livrar da “Ema” que o perturbava. Pediu que a prefeitura contratasse seu Pedro Frutuoso, e os dois imaginaram e projetaram um lago espelho artificial, tendo em seu meio uma pequena ilha rochosa, onde pudesse a “Ema" ser instalada.


O projeto ficou maravilhoso, e até hoje é mantido da forma inicial, sendo a “Ema” um magnífico detalhe harmonico com a praça.


Porém, a saga da Garça-Real, ainda não terminaria, pois iria cair, nas mãos dos vândalos frequentados da Turma da Geral do São João, deseducadas, que não podendo construir, destroem, e a fúria deles voltou-se dessa vez, contra a “Ema” inocente.


No Cine São João, havia duas cafeterias, a da direita pertencia ao Bilicô e a da esquerda a seu Urias. Vendiam café fervido, bolos de milho, quebra queixo, cerveja, Guaraná-del-Rio, cocadas, coxinhas de galinha e outros petiscos. Quando chegava alguém e pedia água, mandavam ir beber no lago da “Ema”.
O Bilicô passou a reclamar que uma saca de açúcar, que dava para dois meses, não estava dando para duas semanas. Seu Urias que as garrafas de Guaraná-Del-Rio, segundo ele, mais caras que o próprio líquido, estavam desaparecendo.
Descobriram que no caso do Bilicô, a Turma da Geral roubava os açucareiros cheios de açucar e os devolviam cheios d’água do lago, pois, diziam querer adoçar as águas do lago da “Eminha”.


No caso do Urias, não devolviam as garrafas de guaraná que compravam, jogavam-as no lago, para no dia seguinte, apanhá-las e vender à própria cafeteria do Urias, onde as tinham roubadas.


Cientificada desses ocorridos, a Prefeitura de Sobral contratou um zelador de nome Lima, para cuidar da área, e ele dela cuidou com zelo, mais até que o esperado, para tristeza da Turma da Geral, que a desejava descuidada.


A limpeza era perfeita, o lago passou a refletir novamente as árvores adjacentes, e a bela imágem da “Ema”, a ponto da Turma da Geral inventar que seu Lima, havia pela "Ema" se apaixonado, e se tornara seu marido, pois, a banhava, tirava o lôdo de suas costas, deixado-a impecável.


A Turma da Geral passou a chamar seu Lima de “Marido da Ema”, fato que o aborrecia. Passaram-se anos, seu Lima faleceu, e no outro dia do enterro a “Ema” amanheceu com as azas cobertas de preto, e usando uma mantilha, colocados pela Turma da Geral, com o intuito de oficializar sua viuvez.
Finalmente tudo se acalmou.
- Acalmou-se?
- Ainda não!


Em 1958, o Pe. Palhano elegeu-se Prefeito de Sobral. Logo depois, num gesto de razões duvidosas, talvez insano, resolveu transferir o Zoológico da Betânia, para as proximidades da “Ema”. Para tal construiu jaulas, na perimetral que a circundava, deixando aberta apenas o lado que dava para a frente do São João.


A “Ema” durante parte dos anos 60, ficou quase toda encoberta pelas jaulas desse projeto sem razão e sem sentido, que não caiu no gosto dos sobralenses, razão pela qual, nos mesmos anos sessenta, as jaulas foram removidas, os animais doado às faculdades e circos, enquanto Pe. Palhano foi merecidamente cassado, pelo Regime Militar, perdeu seus direitos políticos, por pactuar com a irresponsabilidade e a corrupção.




Desde esse tempo acabou-se a Saga da Garça-Real, que durou mais de 35 anos. Hoje a Ema da Praça São João, é um detalhe marcante, cheio de história, e continua a alegrar à todos aqueles que passam ou visitam o belo e acolhedor logradouro de Sobral.


Viva a Ema da Praça São João.

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