sexta-feira, 24 de julho de 2015

Juiz Condena Escravo a Morrer na Forca






Foto ilustrativa
Em 1841 foi executado um tal Sebastião, escravo de Joaquim Francisco do Rego, conhecido como ‘doutor Rêgo’, negociante que residia à Rua Velha do Rosário, atual Coronel José Sabóia, no prédio em que funcionava a Casa Bancária Godofredo Rangel.

Chegando a casa, à noite, o doutor, ao transpor o limiar, sentiu-se agredido e gritou: “Sebastião, meu negro, acode-me!” Este lhe respondeu: “É ele mesmo”, incontinente crava-lhe a faca no estômago, prostrando-o semimorto.

O Dr. Gustavo Barroso narra o fato com alguma variante: teria Rêgo exclamado: “aqui Del-Rei, que morro!” E arquejando ainda teve força para dizer: “foi o meu escravo Sebastião, que me matou”. Depois se imobilizou no sono eterno.

Sob carrancuda direção do juiz de paz Miguel Francisco do Monte, o cirurgião aprovado João Felix Lobo fez no cadáver o exame pericial, que o escrivão Polycarpo de Sousa autuou com sua rasgada letra cursiva. A facada vibrada de modo certeiro, perfurara o estômago.



Joaquim Francisco Rêgo, homem branco, casado e estabelecido com loja de fazenda na Rua do Rosário, era natural de Pernambuco e cursara a Academia de Direito até o 3º ano. Outro pernambucano aqui residente, seu amigo, major Manuel Francisco de Moraes foi quem construíra o sobrado em que funcionava a Farmácia Monte, à Praça do Mercado velho. Acudiu pressuroso à viúva em lágrimas e esporeou agente para que se seguisse sem mais tardança em perseguição do criminoso.


Determinaram-se, pois as necessárias diligências para a captura do desalmado. O juiz mandou chamar dois famosos capitães do mato da localidade: Luciano e Sabino. O amigo do morto mandou secundá-los pelo célebre rastejador Chico Sapateiro. Os três homens ganharam o mato, bem armados. Quatro dias após o crime, a 6 de maio de 1841, trouxeram amarrado o negro, que estava escondido na Lagoa das Pedras, perto do Riacho das Itans.
E no sumário o réu confessou tudo. Roubara um pouco de aguardente ao amo, e com medo do castigo, resolvera matá-lo. Estava ainda embriagado quando o esfaqueou.
O terror das torturas a que se viam submetidos os pobres africanos e seus descendentes crioulos era tal que os levava assim ao homicídio.

O juiz achou que devia ser incurso no grau máximo da pena capitulada no artigo 192 do antigo Código Criminal, vindo a dar a seguinte sentença: “em virtude da decisão retro, condeno à morte o escravo Sebastião, por haver morto o seu senhor, como se vê dos autos. E depois de preenchidas todas as formalidades legais o escrivão remeta ao juiz competente estes autos para execução desta sentença, pagas à custa pelos bens do finado. Cidade de Januária, 19n de maio de 1841. João Fernandes Barros”.


Recolhido ao oratório no dia 15 de junho, no dia 16 saiu da cadeia, que naquele tempo era no primeiro piso do prédio da Câmara de Vereadores, na Praça da Matriz, rumo à forca que haviam armado num terreno baldio para a qual davam alguns fundos de quintais.
Doze guardas nacionais mal fardados o escoltavam de baionetas caladas como sempre, o juiz e o escrivão iam a cavalo. O negro caminhava pálido, de cabeça levantada. “Era magro, de pernas finas, rosto boçal, com beiçola grossa e caída. Segurava a corda fatal, “um condenado às galés perpétuas” (Lourenço Nogueira Campos), verdugo forçado que chorava todo o tempo convulsamente.
Dos instrumentos humanos da bárbara época, era o único que tinha coração.
Ao pé do patíbulo, o carrasco soluçante afastou-se escondendo o rosto com as mãos.
Nem tinha coragem de encarar os paus do suplício. Antes que o juiz tomasse qualquer providência, o escravo Sebastião subiu os degraus da escada, amarrou a corda à trave. Lá em baixo o padre Antonio da Silva Fialho rezava em voz trêmula e alta o Credo.
O réu sorriu, passando o olhar em torno. Depois meteu a cabeça no laço e atirou-se no ar. Levou algumas horas estorcendo-se até que se consumou a asfixia.
O carrasco voltou à cadeia sem nada ter feito, entre os guardas nacionais, cabisbaixo, sempre a soluçar.
As contas da execução do assassino orçaram em 8.840 cruzeiros, que o juiz cobrou com ofícios ao brigadeiro José Joaquim Coelho, presidente da província, e que a Coletoria de Sobral somente pagou dois meses depois. (Até aqui com informações de Gustavo Barroso).
A triste cena realizou-se na Rua da Gangorra, atual Domingos Olimpio, mas não no pelourinho.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário